Às 6h49 de uma manhã de domingo, bombas estouraram no meio da rua. Os cascos dos cavalos no asfalto ressoavam à distância, no ritmo marcial das tropas marchando em direção a dezenas de pessoas espalhadas em um corredor formado por barracas de lona. Nem todas correram. Para onde iriam àquela hora em uma manhã de domingo? Fosse um ermo, uma zona isolada ou periférica sem ruas, casas e edifícios próximos, as imagens poderiam ser as de uma invasão a um campo de refugiados. No centro decadente da maior cidade do Hemisfério Sul, usuários de crack ganham asilo do tráfico. A Cracolândia tem o nome de uma cidade dentro da cidade. Sem controle de imigração, é uma Cidade Proibida sem muralhas e palácios, pobre, abandonada. Cracolândia: cidade-enclave.
Uma só regra da cidade em torno a ameaça: “É proibido se entorpecer em público”. Acabar com a Cracolândia não é uma necessidade urbana, é um objetivo de estado: impor a aparência de ordem pública sobre a babilônia das drogas. A cidade só incentiva o comércio de alucinógenos privado, pois assim ele não precisa ser regulado. A função das cidades é regular o espaço, não seus habitantes. A cidade então interdita imóveis, traça projetos, prepara demolições. Na Cracolândia, a dona de um bar foi expulsa por não ter extintor de incêndio. Um comerciante teve de sair porque sua instalação elétrica estava irregular. Outro foi despejado por abrigar máquinas caça-níqueis.
A cidade decide quais regras usar para proibir seus habitantes de se regularizar. Derruba paredes: terrenos baldios são como pranchetas de desenho. Ergue muros no lugar de portas: destrói o caminho para as invioláveis vidas privadas. Quer desapropriar: privar da posse; obrigar a vender. Em Mongólia, Bernardo Carvalho descreve como os povos nômades se localizam no deserto praticamente ignorando coordenadas geográficas. Os lugares têm os nomes de onde os acampamentos estão. A Cracolândia é despejada, se move. É um lugar sem coordenadas exatas. A Cracolândia está à venda. Vende-se: pessoas.
Uma só regra da cidade em torno a ameaça: “É proibido se entorpecer em público”. Acabar com a Cracolândia não é uma necessidade urbana, é um objetivo de estado: impor a aparência de ordem pública sobre a babilônia das drogas. A cidade só incentiva o comércio de alucinógenos privado, pois assim ele não precisa ser regulado. A função das cidades é regular o espaço, não seus habitantes. A cidade então interdita imóveis, traça projetos, prepara demolições. Na Cracolândia, a dona de um bar foi expulsa por não ter extintor de incêndio. Um comerciante teve de sair porque sua instalação elétrica estava irregular. Outro foi despejado por abrigar máquinas caça-níqueis.
A cidade decide quais regras usar para proibir seus habitantes de se regularizar. Derruba paredes: terrenos baldios são como pranchetas de desenho. Ergue muros no lugar de portas: destrói o caminho para as invioláveis vidas privadas. Quer desapropriar: privar da posse; obrigar a vender. Em Mongólia, Bernardo Carvalho descreve como os povos nômades se localizam no deserto praticamente ignorando coordenadas geográficas. Os lugares têm os nomes de onde os acampamentos estão. A Cracolândia é despejada, se move. É um lugar sem coordenadas exatas. A Cracolândia está à venda. Vende-se: pessoas.
Comente: